Segundo a ABRELPE – Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais – em 2019 foram geradas 79,6 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos (RSU) no Brasil. Ainda segundo a associação, a fração orgânica permanece como principal componente dos RSU (45,3%), havendo um descarte médio de 170 kg de matéria orgânica por pessoa a cada ano. Nesse contexto, a compostagem pode ser uma abordagem interessante a ser considerada em relação aos resíduos orgânicos domésticos, pois reduz a quantidade de resíduos orgânicos passíveis de coleta, podendo reduzir as taxas pagas pelo poder público para a disposição em aterros sanitários e aumentando a vida útil desses aterros. Ademais, pode reduzir os custos de fertilização na produção agrícola e a não aplicação de fertilizantes químicos implica também na redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) associadas à sua produção e utilização. Ressalta-se também que GEE são produzidos em grande volume nos aterros sanitários, devido à degradação da matéria orgânica sob condições anaeróbicas.
Ok, o problema está colocado. Mas onde a computação pode entrar para apoiar a solução dessa questão? Para responder a essa pergunta, vou falar sobre um projeto que coordeno, financiado pela FAPERJ, denominado “Conectando Ciência, Inovação e Inteligência Artificial: construção de um modelo de cidade inteligente mitigador de impactos ambientais através da compostagem de resíduos orgânicos”. Esse projeto conta com a participação de atores representativos, com perfis diversos e complementares, como universidades (Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Universidade Federal Fluminense e Universidade Veiga de Almeida), Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária e as empresas VM9, Organokits e Reciclotron, além do envolvimento da Prefeitura Municipal de Nova Friburgo-RJ.
A ideia é aplicar soluções computacionais, especialmente a Inteligência Artificial, para apoiar a criação de um modelo de negócio inovador, que prevê a coleta dos resíduos orgânicos gerados em residências e escolas por uma empresa parceira do projeto, com sua posterior compostagem, gerando um adubo rico, ou seja, transformando o que poderia ser tratado como “lixo”, em um produto com valor agregado. Nesse sentido, uma das soluções desenvolvidas é um sistema inteligente de coleta de resíduos orgânicos, indicando os pontos sujeitos à coleta e definindo rotas otimizadas, considerando o uso de bicicletas e veículos automotores como meio de transporte, visando à redução das distâncias percorridas, dos custos envolvidos e da produção de GEE. Também já foi desenvolvida uma leira inteligente, usada para fazer a compostagem dos resíduos, leira essa que possui sensores que coletam dados de umidade e temperatura. A ideia é usar esses dados para a criação de um modelo computacional preditivo, visando identificar ações para melhoria da eficiência do processo de compostagem e para geração de adubos de maior qualidade em termos de macronutrientes (N, P, K) e do carbono orgânico.
As soluções englobam também ferramentas focadas na educação ambiental e no estímulo à participação das pessoas na gestão de seus resíduos orgânicos. Nesse sentido, já está disponível a primeira versão de um Assistente Virtual (um chatbot), que interagirá com famílias, estudantes e profissionais de escolas do ensino fundamental, respondendo a questões sobre a separação dos resíduos produzidos e auxiliando na educação relacionada aos benefícios resultantes do aproveitamento dos resíduos orgânicos. Finalmente, outra ferramenta, também usada pelos atingidos pelo projeto, um app para smartphones, contém mecanismos de pontuação e recompensas, a partir da concessão de promoções e descontos em lojas/serviços para os mais engajados na gestão dos seus resíduos. Seu foco consiste no estímulo à participação a partir da aplicação dos conceitos de gamificação.
Enfim, a ideia é implantar um modelo de negócios inovador, suportado por soluções baseadas em Inteligência Artificial (IA), que trará benefícios ambientais, econômicos e sociais, com potencial de replicação em todo o estado do Rio de Janeiro e qualquer região no Brasil e no mundo.
Meu próximo artigo falará com um pouco mais de detalhes sobre a leira inteligente. Até lá!!

Anderson Namen é cofundador e cientista de dados da Digital Innovation Consulting Group, empresa focada em ajudar outras empresas a habilitar o digital como um importante impulsionador de negócios em vários setores da economia. Doutor em Engenharia de Sistemas e Computação pela COPPE/UFRJ, possui experiência de mais de 30 anos, tendo liderado projetos inovadores em diferentes organizações. Seu foco se concentra primordialmente em projetos englobando ciência de dados e sistemas de suporte à decisão. Atua também como professor de graduação e programas de pós-graduação na Universidade do Estado do Rio de Janeiro e na Universidade Veiga de Almeida.
Desenvolve há mais de 10 anos projetos ligados ao meio ambiente, envolvendo a análise da biodiversidade e suas relações com o clima, além da gestão e monitoramento de fauna. Na área de gestão de resíduos sólidos, teve projeto de rastreabilidade de resíduos perigosos selecionado entre os 3 melhores projetos ligados ao meio ambiente, sendo premiado no RFID Journal Green Awards, evento patrocinado pelo mais conhecido jornal focado em tecnologia RFID no mundo. Atualmente coordena projeto de aplicação de Inteligência Artificial para gestão de resíduos orgânicos, patrocinado pela Faperj, que envolve 8 diferentes organizações públicas e privadas, entre elas Embrapa, UFF, UERJ e Universidade Veiga de Almeida.
Liderou diversos projetos na área de educação, utilizando dados do INEP/MEC para previsão de resultados relacionados ao processo ensino-aprendizagem de estudantes do ensino básico. Também atou no planejamento e elaboração de currículos para o ensino superior e na criação de sistemas de apoio à decisão focados na experiência do aluno. Ainda na área de educação, liderou equipe transdisciplinar para criação de recursos de on-line focados nos diferentes estilos de aprendizagem dos estudantes, sendo agraciado com premiação pelo desenvolvimento de melhor disciplina on-line entre 15 diferentes instituições de ensino superior na América Latina.
Atuou durante 25 anos como diretor da empresa E3A Educação e Assessoria, tendo desenvolvido projetos de consultoria para empresas como Furnas Centrais Elétricas, Fundação Getúlio Vargas e Universidade Veiga de Almeida. Anteriormente, trabalhou nas empresas Mesbla Lojas de Departamentos e IBM Brasil, sendo reconhecido nessa última com 3 prêmios de contribuição significativa ao negócio.